segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Última carta ao Pai Natal






Querido Pai Natal:
Poderás, porventura, estranhar que, a um mês e tal de distância, te esteja a escrever.
Sei que vais achar estranho mas também tal só acontece porque tens memória curta e a fuligem das chaminés não te tem acrescentado nada, para além de um bronzeado que pouco falatará para merecer elogios do Berlusconi.
No final das festas do ano passado, só não levaste com uma cartinha de repúdio porque o meu pai pôs-se a mandar postais de agradecimento para a família - como é muito boa!... - e, quando dei por mim, já nem envelopes havia. Ainda me agarrei ao MSN mas apanhar-te on-line é que está quieto!...
Passou-me a neura e a muito custo lá mandei umas gaitadas no pífaro que me deixaste no sapatinho. E digo-te uma coisa não preguei com pífaro no ecoponto logo de seguida porque a minha avó pôs-se-me a fazer ternurices para eu soprar naquela porra e quando me acenou com uma notinha de 5 aéreos, lá lhe fiz a vontade.
A neura passou a revolta quando me apercebi que no segundo embrulho estava uma caixa de lápis de cera e uma javardice de um livro para colorir. Deves pensar que eu tenho tempo para os trabalhos manuais que metam lápis de cera.
Cera andas tu a fazer o ano inteiro, meu banhudo!
Trabalhas um dia por ano, pões as renas e os veados a carregarem-te a celulite e arejarem-te a barba e, lá para as duas ou três da manhã do dia 25, fechas a loja e andas na moina mais 364 dias. Comes e bebes, pões o amanuense a responder-te às cartas dos putos, mandas o fato para a 5 à Sec e enterras-te no sofá o ano inteiro a adicionares velhinhas no Hi5 e brasileiras no Orkut, meu banhudo convicto!
Para o Zé, ferras-lhe com um pífaro e lápis de cera... Eu tenho-as cá guardadas!.
Também te queria agradecer a ternura das cuecas com o ursinho e as meias do Tom &Jerry.
Por acaso era mesmo o que eu queria!...
Andei o ano inteiro a fazer olhinhos ao carro da polícia e a uma metralhadora e tu, sem me pedires opinião, achaste que as cuecas, as meias, o pífaro e os lápis me reconciliavam com a velha dos 5 aéreos e contigo, meu celulítico compulsivo.
Tiveste sorte...
Se te tens atrasado a zarpar da chaminé levavas com o pífaro na mona e ias de cuecas para a Lapónia que havias de rapar um briol de caixão à cova.
O parvo do filho do meu vizinho levou com a playstation, ao filho do ingenheiro deste-lhe o télélé e a mim, filho do Jaquim - repositor no Lidl - ferras com a porra do tubo com buracos, umas cuecas amaricadas e uma meias de lã com um gato e um rato...
Para quê isto?!...
Mas porque carga d'água é que todos os anos me fazes estas torturas?!...
Quando não é meias, é um cachecol. Quando não é o cachecol, é uma camisola de gola alta - e a porra da camisola fica sempre curta nas mangas.
Tás apostado em atazanar-me a vida, já vi tudo.Tu e mais a tua Rudolph - que, deixa que te diga, manda assim uns abanares de cabeça meio esquisitos e, depois, aquele narizinho a brilhar levanta-me muitas dúvidas...Não sei, não!...
Vê lá se atinas porque desatinado já eu estou.
Mas este ano, meu banhudo irreversível, vais ter que atinar.
Já pedi à velha dos 5 aéreos para fazermos os dois um quarto de sentinela à porra da chaminé e se te vir a descer com aqueles embrulhinhos onde só cabem meias e pífaros, podes ter a certeza que levas com o alguidar das filhozes pelo fato abaixo e hei-de-te perseguir com um talo de couve chaminé acima.
Levas um aperto que te há-de ficar nessa memória caquética e prevertida.
Não te apliques e vais ver a tua vidinha a entrar em recessão.
É que te vou causar uma coisa nociva à tua saúdinha...
É que só tens feito desgraça.
Lembras-te há dois anos que ofereceste à minha mãe um trem de cozinha, não lembras.
Sabes quem é que estreou a colher de pau, não sabes?
E agora vem-me cá dizer que não te passou pela cabeça que isso era o mais certo.
E ao meu pai lembras-te também, não lembras?!...
O que é que foi? Um cinto, pois claro...
E quem é que o estreou, meu alarve? O filho do Jaquim, eu, moi même, cá o je!...
E depois vem dizer que isto são coincidências!...São coincidências, são!...Vê se lá se alguma vez te ocorreu que eu havia de gostar de ter um taco de baseball...
Nunca.
Nunca... E sabes porquê?
Porque podia dar-se a coincidência de seres tu a estreá-lo!...E depois vem-me dizer que sou eu que sou desconfiado e que chamo o azar !...
Fico-me por aqui. A ver se ainda meto isto antes da tiragem da tarde. Cá te espero para a soirée de 24.Não te ponhas fino e vais ver a animação que vai haver!...
Olha o talo da couve!...
Adeusinho e até lá.
Texto: ©Zeke Skreve
Imagem: palavrasnovento.nireblog.com

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