domingo, 7 de dezembro de 2008

É já de longe que vos escrevo...




Desconhecia, até há bem pouco, muita coisa.
Tanta coisa...
Demasiado para quem julgava já saber quase tudo.
A gente faz os percursos, trocamos afectos, companheirismos e quando um dia olhamos para trás temos sempre a sensação que a poeira apagou os passos dos que fizeram as viagens connosco. Refazer o desenho dos passos e dos contornos é sempre difícil, penoso. Ficamos sempre com a sensação que desleixámos alguma coisa, de tal maneira andávamos a olhar para nós

Vivemos, a partir daí, nas memórias dos laços que foram ficando neste ou naquele detalhe, nesta ou naquela fisionomia, neste ou naquele gesto ou sorriso... Nesta ou naquela contrariedade.

Um dia temos de largar o conforto e a protecção da alcateia.
Os novos chegaram e as regras alteram-se: os Alphas e os Ómegas regateiam o lugar, atropelam as crenças e os valores antigos, criam espaços, códigos e alianças e é aí que os velhos "guerreiros" arrumam a trouxa, rasgam os livros e fazem-se à estrada porque o caminho ainda é longo. É o cansaço e a sensatez que anunciam a hora de zarparmos e esperar que o inverno não seja frio e ingrato, pelo menos enquanto não abandonarmos a estrada.

Arranja-se um canto que nos abrigue de tudo quanto protegemos aos outros, durante muito tempo.
Durante demasiado tempo... O tempo em que nos fomos esquecendo de nós próprios e dos que, sendo-nos mais chegados e queridos nem por isso tiveram a nossa presença e protecção. É esse o amargo que nos fica para o caminho e é com esse sabor que voltamos para eles, esperando que esqueçam as ausências, as partilhas mal compensadas e depressa ignoradas.

Se tivermos prole... Bom, aí ainda temos de arranjar o naco do nada que resta para os acompanhar na viagem deles... Para a suavizarmos, para lhe limparmos as pedras do caminho, para os proteger no percurso e no sono...
Um dia eles farão o mesmo.
Só por isso...
Porque pelo resto, o ciclo estaria encerrado com um simples e amargo virar de página.

Contudo, os novos Alphas e Ómegas da alcateia também crescem, entretanto... E cedo se apercebem que um dia, também eles, terão uma viagem a fazer...
Nem todos.
Alguns vão-se defendendo na maneira como se entregam... Vão usando da protecção e deixam-se proteger agradecidamente, sobretudo porque ser Ómega tem vantagens e reconhecimentos: as partidas têm sempre o brilho das festas de salão e o caminho, a partir daí, já está aberto e escolhido.

Só a amizade dos percursos fica.
Essa vai valendo... Porque há códigos que nunca se quebram.

Neste canto, onde os velhos companheiros de estrada, os nómadas ocasionais e os silêncios se partilham e se descobrem erraticamente, vos espero. E neste retiro, de onde vos escrevo, terei sempre um lume aceso: para que nunca se percam, nunca se distraiam, nunca se entreguem, nunca deixem que vos escolham o caminho.
Nem sempre será assim.









Os homens e os lobos apenas se diferenciam num único momento da vida: no fim.
Os homens procuram e chegam-se ao conforto, ao apoio e às despedidas dos que lhe são queridos.
Os lobos afastam-se da alcateia, entram nos bosques, e aguardam o fim num solitário exercício de espera e recolhimento porque os códigos de conduta são para cumprir.
Para que o fim tenha a dignidade de uma vida.

Até lá, vaguearei por aí a perceber os silêncios e os nómadas que se vão cruzando erraticamente nos percursos, para que cumpra a última caminhada e missão antes de entrar nos bosques: guardar os lobos para que não desçam ao povoado e despertar os inocentes para o silêncio dos lobos.
Com amizade e solidariedade, sempre.
"Semper fidelis"
Zeke Skreve

©J.Tereso

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